quarta-feira, 11 de janeiro de 2017

Da capacidade de imaginar à ação política

Crônica publicada no Jornal D´Aqui em Janeiro de 2017

Entre o ente devedor e o ente consumidor há um espaço que poucos veem e muito menos deles têm consciência.  Em nossa vida privada fortemente privilegiada  na escala de valores das últimas décadas  tendemos a buscar refúgio  na interioridade,  o que nos levou ao distanciamento  da noção do coletivo e de que somos,  na verdade,  todos um.
É preciso muita imaginação para escaparmos das imposições angustiosas diárias das notícias e dos acontecimentos mundiais.
Hannah Arendt chama esse processo de “desmundialização” que paradoxalmente acontece em paralelo com a reconhecida  globalização econômica e cultural. Diz ela ter ficado estarrecida com  a  aceitação e a banalização das práticas desumanas  encontradas na sua pesquisa para elaboração do livro “ Eichmann em Jerusalém” .
                                                    
 Nessa linha de pensamento ela atinge o ápice  de uma questão presente hoje nas chacinas nas prisões do Brasil e nas guerras entre etnias e grupos com interesses econômicos no Oriente além de tocar outras questões. As formas políticas atuais burocratizadas por indivíduos normais   estão descompromissadas da visão mais ampla e reflexiva sobre a idéia de sociedade como sendo um organismo único  maior.
A resposta dos indivíduos a esses estímulos imperceptíveis  parece  gerar  a preferência generalizada do indivíduo em  ficar no espaço  entre o dever e o consumir camuflando – até por conforto e proteção -  a realidade,   para não pensar ou imaginar um mundo diferente.
Em contrapartida ,  o acesso à imaginação dá-se  inevitavelmente pela Arte. Seja de que modalidade for, ela exige o desapego dos padrões, exige a coragem de criar, exige a formação de novas sinapses, exige o abandono da realidade imposta, exige o uso do hemisfério direito do cérebro – seja fazendo ou fruindo uma obra de arte. Daí pode-se dizer que um sujeito iniciado nos domínios e nas consequências da Arte é um privilegiado e um vencedor sobre as imposições  subliminares a que a massa está exposta e impelida diariamente.
"Em mar revolto"  Fio encapado, rede de chapa expandida e acrílicas sobre madeira  
As coisas prontas, as imagens excessivas, as obscenidades mais obscenas que o obsceno – citando Jean Baudrillard – as distrações ,  aí estão tentando abafar toda e qualquer  capacidade do ser humano imaginar um mundo diferente. As “Estratégias Malévolas” apontadas por Noam Chomsky embora grassem soltas em todos os meios e estratagemas de comunicação  aí estão para serem repelidas ou confrontadas  a fim de que não tenhamos que viver  apenas soterrados pelos atrofiamentos  de caráter  político, econômico e social que nos assombram historicamente.


                                                           
Encarar a Arte como um possível caminho em direção à liberdade e à responsabilidade que temos uns para com os outros aparece como um ato de resistência. Procurar conhecer para fazer diferente : exercer a capacidade de ver o todo, intuir  caminhos e formas de seguí-los, sair do conforto habitual, e ir em busca do momento re-criativo .
Assim fica o convite : instrua-se na Arte, solte sua imaginação,  constitua-se como sujeito da ação e da reflexão .
Aja politicamente!